Voar mais alto?
Quando tinha 19 anos (lá em 1970), queria voar mais alto. Era recém convertido a Cristo, mas achava que o meu feitio introvertido não servia para falar com os outros acerca da minha fé.
Estava num pequeno núcleo de estudantes (o «GBU») de Cambridge. E o meu «college» tinha uma alta percentagem de filhos da classe alta... cujos pais em tempos tinham estudado no mesmo «college». Vindo de uma família modesta de agricultores, sentia-me deslocado.
Dentro de pouco tempo, percebi que havia dois tipos de crentes no grupinho. Os crentes «normais», evangélicos conservadores (anglicanos, baptistas, Irmãos, etc.) e os crentes «baptizados pelo Espírito». Estes normalmente não eram das denominações pentecostais mas sim dos movimentos «carismáticos, que surgiam nas mais diversas denominações – e mesmo na Igreja Católica. Como alguns juntavam à sua experiência de baptismo no Espírito e línguas o serem extrovertidos, e estarem à vontade nos mais diversos meios sociais, eu julgava que estes espiritualmente voavam mais alto. Fiquei com uma vontade enorme de «voar» com eles, especialmente como um que estava na mesma Faculdade que eu e com quem, durante um tempo, tive bastante amizade.
A ideia era mais ou menos assim: alguns crentes têm apenas Cristo, e o Espírito Santo a morar neles, mas falta-lhes poder. Precisam de uma libertação – de um «baptismo» que os faça rebentar as correntes da sua personalidade – e comunicar com todos com brio e vivacidade. Outros têm Cristo e «mais qualquer coisa».
Depois de apreciar com o meu colega as passagens bíblicas de Actos dos Apóstolos que mostram o poder com que os apóstolos testemunhavam de Cristo, pedi para ser baptizado assim. E senti alívio e alguma exuberância. Falei línguas, mas apenas para mim – não me atrevia mesmo assim a fazer isso em público.
Foi bom ou não foi, ter passado por essa experiência? Julgo que o esforço determinado de procurar mais de parte do Senhor, de procurar de coração ser cheio do Espírito, é bom.
Por outro lado, a sensação de ter subido para um patamar superior de espiritualidade, fazia com que me sentisse superior a outros crentes ao meu lado. Superior àlguns que de facto eram aqueles que mais me ajudavam. Superior, inclusive, aos conhecidos pregadores que vinham dar a exposição semanal. Durante um tempo cheguei ao ponto de achar que tinha pouco a aprender dos Drs. John Stott e Jim Packer. Que vergonha! Queria era ouvir alguém «cheio do Espírito» (e esse não eram): um Oral Roberts, se tivesse vindo, talvez me servisse!
Percebi afinal que estava a cultivar uma ilusão. Estava a querer mudar a minha personalidade. Estava a partir da base de que a minha maneira de ser introvertida era inferior ao temperamento extrovertido do meu colega. Como serás evidente, não mudei de personalidade e, depois de algum tempo, tive que constatar que era eu, tal como era, com quem Deus desejava fazer a Sua obra: não um «eu» modificado, modelado com base numa personalidade diferente. E, da forma que a minha personalidade permitia, pude testemunhar de Cristo entre os meus colegas.
Tive que constatar que, para tudo o que Deus quisesse fazer na minha vida, Cristo era suficiente. E procurar dEle, diariamente, a plenitude do Espírito, não imaginando que pudesse de repente ser catapultado para outro nível em tivesse «Cristo mais alguma coisa», não imaginando que precisasse de ficar livre do meu temperamento que, afinal, era um dom precioso de Deus.
25 maio 2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
2 comentários:
Agradeço o rico testemunho. Também passei um pouco por isso tudo. Foram experiências importantes, sem dúvida. Mas, mais importante do que grandes experiências de voar nas alturas, hoje valorizo mais o caminhar aqui em baixo com os pés na terra e o coração cheio do Espírito.
Um forte abraço.
Deus sempre em primeiro lugar.
Saudações e parabéns pelo blog!
Enviar um comentário