27 janeiro 2009

A voz que ouço, é do Senhor ou é minha?



Ao ocupar-se dos negócios do reino, em lugar de seu pai David, o jovem Absalão dá a impressão de ser extremamente habilidoso – um líder promissor com qualidades para ter um reinado mais bem sucedido do que do seu pai. O povo deixa-se convencer com facilidade. Absalão é belo e agradável e tem uma cabeleira impressionante......

Apesar de tudo, a imagem conta. E se Absalão vivesse hoje – não seria um sucesso?

Mas Absalão tem um defeito de fundo, que consegue disfarçar no princípio, mas que termina por ser a sua ruína. A voz interior que ouve (que ele talvez julgue ser a voz de Deus) é realmente a voz da sua própria ambição.

Pessoalmente, fico apreensivo com pessoas que dizem com frequência que ouvem a voz de Deus. Desconfio que o seu «Deus» possa ser nem mais nem menos do que a voz da sua própria ambição. Fico também apreensivo com pessoas que elegem outra pessoa para ser a sua «voz infalível» - o «profeta»

através de quem Deus sempre lhes fala. Normalmente, se falamos com estas pessoas com base na Bíblia, não têm muita paciência para ouvir: julgam que elas próprias, ou o seu profeta predileto, estão mais perto dEle do que nós.

O «profeta» predileto de Absalão chama-se Aquitofel. Quando Absalão o ouve falar, fica deliciado: é como se Deus lhe falasse directamente (2 Samuel 16:23). E Absalão é um homem ambicioso: Aquitofel é suficientemente astuto para saber que, para influenciar o jovem revolucionário, tem que falar de acordo com a «voz interior» da ambição dele. Mas, quando lemos o primeiro conselho que Aquitofel dá a Absalão, ficamos abismados: aconselha-o a consolidar a sua posição com os seus apoiantes, entrando a todas as concubinas do seu pai. Será mesmo Deus que lhe dá essa ideia? Mas Absalão segue o conselho porque está nos seus interesses.

Mais adiante Aquitofel dá outro conselho que, nas circunstâncias, parece bastante acertado – que Absalão o deixe ir de noite para atacar o rei de improviso, aproveitando o seu cansaço para o vencer rapidamente. Só que a seguir Aquitofel dá outro conselho, desta vez através de uma pessoa chamada Husai, que aparece pela primeira vez. Podemos perguntar-nos por que é que Absalão vai ouvir a voz de Husai, se mal o conhece e se Aquitofel é quem fala directamente com Deus?

O que acontece é que Husai sugere um plano muito mais ambicioso. Sugere que Absalão junte todo o Israel, planeando tudo com tempo e com um alto grau de organização, para derrotar David numa grande batalha que será completamente decisiva. E, neste caso, será o próprio Absalão que irá à frente das suas tropas! Poderia haver algum plano de auto-promoção melhor do que este, para Absalão seguir?


Agora - se Aquitofel costuma falar da parte de Deus, e Husai é quase um desconhecido - porque será que, de repente, Absalão gosta mais da ideia de Husai do que da do seu «profeta»? O facto é que é Husai que toca no ponto essencial, dizendo que Absalão irá à frente das tropas. Apela à ambição do jovem revolucionário. Assim, de repente, este acha que Deus deve estar a falar por meio de Husai! Afinal parece que o «Deus» de Absalão não é o Senhor soberano dos céus e da terra, mas sim a sua própria ambição. Durante um tempo pode ter parecido que usava o nome de Deus e que de facto honrava o Senhor. Agora fica claro a quem é que Absalão serve realmente.

Em breve vemos que é exactamente o conselho de Husai que traz a derrota a Absalão. O verdadeiro Senhor dos céus e da terra foi Quem determinou que Husai desse este «mau» conselho – para que Absalão fosse derrotado e julgado!

Acho que devemos pensar bem nisto. Quando nos convencemos de que Deus nos falou, de quem é que foi realmente essa voz? E se uma pessoa tão inteligente como Absalão seguiu tão maus conselhos, qual é a garantia de que nós, confiando na nossa «voz interior», não vamos enganar-nos tão redondamente como ele?

Publicado também no «Reflexo», boletim da Igreja Baptista de Caldas da Rainha.