25 maio 2010

Voar mais alto?

Voar mais alto?

Quando tinha 19 anos (lá em 1970), queria voar mais alto. Era recém convertido a Cristo, mas achava que o meu feitio introvertido não servia para falar com os outros acerca da minha fé.
Estava num pequeno núcleo de estudantes (o «GBU») de Cambridge. E o meu «college» tinha uma alta percentagem de filhos da classe alta... cujos pais em tempos tinham estudado no mesmo «college». Vindo de uma família modesta de agricultores, sentia-me deslocado.
Dentro de pouco tempo, percebi que havia dois tipos de crentes no grupinho. Os crentes «normais», evangélicos conservadores (anglicanos, baptistas, Irmãos, etc.) e os crentes «baptizados pelo Espírito». Estes normalmente não eram das denominações pentecostais mas sim dos movimentos «carismáticos, que surgiam nas mais diversas denominações – e mesmo na Igreja Católica. Como alguns juntavam à sua experiência de baptismo no Espírito e línguas o serem extrovertidos, e estarem à vontade nos mais diversos meios sociais, eu julgava que estes espiritualmente voavam mais alto. Fiquei com uma vontade enorme de «voar» com eles, especialmente como um que estava na mesma Faculdade que eu e com quem, durante um tempo, tive bastante amizade.
A ideia era mais ou menos assim: alguns crentes têm apenas Cristo, e o Espírito Santo a morar neles, mas falta-lhes poder. Precisam de uma libertação – de um «baptismo» que os faça rebentar as correntes da sua personalidade – e comunicar com todos com brio e vivacidade. Outros têm Cristo e «mais qualquer coisa».
Depois de apreciar com o meu colega as passagens bíblicas de Actos dos Apóstolos que mostram o poder com que os apóstolos testemunhavam de Cristo, pedi para ser baptizado assim. E senti alívio e alguma exuberância. Falei línguas, mas apenas para mim – não me atrevia mesmo assim a fazer isso em público.
Foi bom ou não foi, ter passado por essa experiência? Julgo que o esforço determinado de procurar mais de parte do Senhor, de procurar de coração ser cheio do Espírito, é bom.
Por outro lado, a sensação de ter subido para um patamar superior de espiritualidade, fazia com que me sentisse superior a outros crentes ao meu lado. Superior àlguns que de facto eram aqueles que mais me ajudavam. Superior, inclusive, aos conhecidos pregadores que vinham dar a exposição semanal. Durante um tempo cheguei ao ponto de achar que tinha pouco a aprender dos Drs. John Stott e Jim Packer. Que vergonha! Queria era ouvir alguém «cheio do Espírito» (e esse não eram): um Oral Roberts, se tivesse vindo, talvez me servisse!
Percebi afinal que estava a cultivar uma ilusão. Estava a querer mudar a minha personalidade. Estava a partir da base de que a minha maneira de ser introvertida era inferior ao temperamento extrovertido do meu colega. Como serás evidente, não mudei de personalidade e, depois de algum tempo, tive que constatar que era eu, tal como era, com quem Deus desejava fazer a Sua obra: não um «eu» modificado, modelado com base numa personalidade diferente. E, da forma que a minha personalidade permitia, pude testemunhar de Cristo entre os meus colegas.
Tive que constatar que, para tudo o que Deus quisesse fazer na minha vida, Cristo era suficiente. E procurar dEle, diariamente, a plenitude do Espírito, não imaginando que pudesse de repente ser catapultado para outro nível em tivesse «Cristo mais alguma coisa», não imaginando que precisasse de ficar livre do meu temperamento que, afinal, era um dom precioso de Deus.

04 maio 2010

Miopia evangélica....

A nossa equipe de pregadores na igreja acaba de terminar uma série de mensagens expositivas sobre Apocalipse. A parte do trabalho que me competiu foi expor, entre outros capítulos, o 17 (prostituta de Babilónia - ver última postagem) e 21 (nova Jerusalém).

Desta vez, tendo entregue Apoc. 20 a um membro da equipe, fiquei livre de me pronunciar sobre o velho problema do milénio! Alguns anos atrás mudei de «a-mil...» para «pré-mil...» - mas, sinceramente, o debate já não me parece tão importante - facto este que a minha última turma no Seminário a tratar da escatologia deve ter percebido!

Mas, agora, Apocalipse 21! Fala sobre uma cidade que de Deus desce para a terra (v.2). Fala sobre a transformação de todas as coisas - «novos céus e nova terra em que mora a justiça». É o último e supremo cumprimento do propósito de Deus para o universo que criou: nenhum «a-m...», «pré-m...» (histórico ou dispensacionalista) ou «pós-m...» pode negar este facto central da esperança do cristão para o futuro. É tão central para a Bíblia como o é a doutrina da ressurreição do corpo, ensinada em João e nas epístolas de Paulo, em cumprimento das promessas do V.T.

As implicações ecológicas desta promessa são espantosas. Só se consegue explicar a indiferença histórica dos cristãos a problemas ambientais por uma miopia grave generalizada relativamente a esta doutrina bíblica.

Quando vamos ver hinos e cânticos nas nossas colectâneas, vemos os sinais mais flagrantes desta miopia secular, resultado naturalmente da infiltração de ideias gregas na doutrina cristã. Praticamente todos os hinos do Cantor Cristão e o Hinário para o Culto Cristão, por exemplo, falam como se a suprema esperança do cristão fosse a ida da sua alma para morar eternamente no céu (a fase que a teologia chama apenas a intermediária). Chegam ao ponto de lamentar o nosso apego às coisas belas da criação de Deus!

E nesta área os coros mais novos pouco ajudam. Inovadores na sua melodia e ritmos, muitas vezes são tradicionalistas e limitados no seu conteúdo.

Onde se encontram ecos, no suspiro do cristão para o cumprimento de todas as coisas, das palavras de Paulo... que diz que não desejava ser despido mas revestido (2 Cor. 5:4) para que o mortal fosse absorvido pela vida?

Miopia evangélica