19 outubro 2007

Transfiguração - e discípulos confusos

Transfiguração ... e discípulos confusos


Na altura em que Jesus leva com Ele ao monte o grupo íntimo de três discípulos – Pedro, Tiago e João – e apresenta-se diante deles uma figura glorificada (Marcos 9:2) –a nossa tendência é tomar o momento como um dos mais altos no percurso destes três discípulos. Mas, quando o consideramos no contexto, há um sentido em que é um dos momentos em que eles entram na maior confusão.


O síndrome deles - que saiu à superfície na reacção de Pedro seis dias antes, em Cesareia de Filipe – é bem conhecido. Eles querem a vitória de Jesus sem Ele –ou eles –terem que passar pelo sofrimento. Nas palavras de Lutero, são adeptos da Teologia da Glória sem passar pela Telogia da Cruz. Querem a Teologia do Sucesso ou da Prosperidade – sem o drama do fracasso aparente e o escândalo da maldição associado com a cruz (a forma de pena capital mais bárbara que existe na altura). Querem bênção – mas sem ter que pagar o preço.


Talvez não seja muito surpreendente que a primeira reacção de Pedro, ao ouvir do futuro sofrimento de Jesus, seja um de incredulidade e rejeição. Mas, mesmo assim, Jesus não é suave na Sua reacção. Chama Pedro Satanás e manda-o embora. A ideia de um Messias sofredor não entra bem na mentalidade judaica. Mas Jesus insiste. E diz que os discípulos terão que tomar a sua cruz – com a mesma resignação e a mesma persistência com que Ele a tomava.


A seguir, diz que alguns dos Seus acompanhantes não vão morrer antes de ver a Sua vinda com poder. Passam seis dias e – de certa maneira – eles vêem a Sua vinda, pelo menos uma antecipação dela, em que presenciam a Sua glória. Se entendo bem as implicações da narrativa, o que acontece aqui é o seguinte. Eles vêm o Messias na Sua glória - mas deduzem que aquilo que o mesmo Messias acaba de lhes explicar sobre a cruz foi afinal um grande erro. Eles entendem que Jesus já está na Sua glória! Elias e Moisés estão com Ele – assim vê-se que a esperança messiãnica dos judeus foi cumprida. Ainda bem, pensam eles, que a conversa pessimista que Jesus acaba de ter sobre a cruz foi só um desvario temporário. Agora eles compreendem que Ele vai ver que Se enganou! Estão aliviados e contentes porque, afinal, Deus agiu depressa – e deu-lhes a razão. Glorificou Jesus – ao mesmo tempo que mostrou que o Seu Filho afinal tinha cometido um erro temporário!


Os três discípulos podem assim ter também o seu problema de auto-estima resolvido. Eles têm uma tendência innata de discutir importâncias – de considerar quais podem vir a ter os lugares de maior prestígio no Reino que eles visualizam. A proposta disparatada das três cabanas – embora seja principalmente a favor de Jesus, Elias e Moisés – poderá ser uma maneira de assegurar que, no mínimo, eles serão os três mais destacados acompanhantes. E qual seria a necessidade de alguma vez terem que descer do monte? Eles estão seguros em relação com a sua própria situação: os outros nove estão no seu lugar – lá em baixo!


Mas, mais uma vez, Jesus age de uma forma que não corresponde minimamente com as expectativas dos Seus discípulos. Não só manda descer do monte – mas também manda guardarem segredo enquanto Ele não ressuscite dos mortos!


Como é que Jesus poderia voltar a esse assunto agora, pensam eles? Os profetas diziam que Elias devia vir antes da Sua glorificação. Mas Elias acabava de vir. E era o momento dEle agora! A que propósito vem a Sua insistência sobre morte e ressurreição?


Pouco depois, caminhando pela Galileia, os discípulos tentam expulsar um demónio e não conseguem (9:18). Isto, depois de terem recebido e terem usado o poder para o fazer (cf. 6:7 e 13)! Como alunos estão claramente a retroceder. E Jesus ainda tenta outra vez explicar-lhes o caminho da cruz. Eles não entendem e até de Lhe perguntar têm medo. Por quê? Porque estão a discutir qual deles vais ser o maior no Seu reino!


Um dos maiores sofrimentos de Jesus – antes do Gólgota e do Calvário – é ter discípulos que não aprendem. Só depois do Pentecostes é que Pedro vem a compreender bem as suas experiências (cf. 2 Pedro 1:17-18).


Todos nós tendemos a ter o gosto de ocupar lugares de prestígio. Todos gostamos de receber bênçãos sem pagar o preço. Todos nós gostávamos de poder ser arrebatados e saltar para a glória, antes de sofrer qualquer tipo de rejeição ou tribulação. Mas, assim, fazemos com que Jesus sofra intensamente connosco. O Evangelho «barato» e sensacionalista que é anunciado hoje fá-lO sofrer. Cada «conversão» -quando não acompanha uma entrega para tomar a cruz de Jesus e seguí-lo (mas, mesmo assim, é usado como uma estatística para demonstrar o crescimento da igreja) – fá-lO sofrer também.


Não será melhor nós também nos dispormos a sofrer – se isso for necessário? E prescindir de lugares de prestígio – para tomarmos a nossa «cruz» de troça e rejeição – para andarmos como Ele andou?

05 outubro 2007

O INCÊNDIO

Na segunda feira, dia 1 de Outubro, estava tranquilamente a começar a assar a carne para o almoço, quando o John (que, com a Laura, ainda está aqui no Centro, à espera do fim das obras na casa no Porto), veio perguntar: «É suposto a erva à frente da casa estar a arder?».
Quando fui ver, estava mesmo a arder. E não era suposto.
Também estava a arder a erva na propriedade dos vizinhos e o vento vinha desse lado. A mãe da nossa vizinha estava a trazer baldes de água, mas as chamas só subiam mais.
Do nosso lado havia uns baldes, alguns rotos, outros sem asa, e uma mangueira desconjuntada que não chegava ao lugar das chamas.
O pior é que as chamas estavam a avançar na direcção do pinhal do vizinho. Tivemos que tentar segurar a mangueira de maneira a fazer chegar uma parte da água até a parte que estava a arder. E, entre os baldes, houve alguns que ainda podiam ser usados. Veio o Ricardo para ajudar, e a Branca, que está connosco no Centro.
Não pudemos dar atenção ao fogo do lado dos vizinhos, porque o pinhal do outro lado da nossa propriedade estava em perigo. A vizinha, que tem problemas de saúde, ficou quase em desespero.
Chamámos os bombeiros e, enquanto chegavam, fomos lutando do nosso lado. O John trouxe um tapete velho e entre todos conseguimos que as chamas parassem - a um metro praticamente do pinhal. Do lado dos vizinhos as chamas foram consumindo mais (só que era vegetação que de qualquer maneira queriam queimar). O pior seria se o vento mudasse e as chamas fossem para a propriedade dos vizinhos do outro lado.
Quando os bombeiros chegaram dominaram as chamas todas em poucos minutos.

Com o meu «vício» de pregador, de tentar tirar lições das situações, fui pensando. Dei graças a Deus pelo facto de as chamas pararem. Não era um exemplo maravilhoso da Sua graça? Mas, alguém podia dizer, «se vocês não tivessem lutado, mesmo com mangueiras e baldes rotos, o pinhal não teria ardido?». Então, afinal, é graça divina, ou são obras humanas? Ou é uma mistura das duas coisas?
O que teria valido o nosso esforço se o vento tivesse sido um pouco mais forte... se a erva tivesse crescido um pouco mais.... se tudo tivesse acontecido numa hora em que não estivéssemos em casa? Mesmo a nossa luta foi com a energia que Ele nos deu -e o facto de os baldes e as mangueiras, que nós deixámos estragar, ainda funcionarem em parte, teve alguma coisa a ver com a Sua misericórdia! Tudo isto diz qualquer coisa sobre a relação entre o nosso esforço e a graça divina. Filipenses 2:12-13!

Depois, pensei: «não devíamos ter dado mais atenção à propriedade dos vizinhos». O erro teria sido deles, mas nós não devíamos lutar para que eles não apanhassem piores consequências? O que teria pensado alguém a passar, ao ver-nos lutar desesperadamente para apagar as chamas do nosso lado, aparentemente ignorando o problema deles?
Eles, os vizinhos, depois disseram que estavam mais preocupados com o pinhal ao lado da nossa propriedade e, eventualmente, caso o vento mudasse, com a propriedade do outro lado do deles. Tratando da parte que era propriedade do Centro, apesar de representar pouco prejuízo, sendo um terreno em que a erva facilmente crescerá de novo, estávamos sem dúvida a fazer o melhor possível para que o problema não tivesse piores consequências.

Aqui, se houver outro «moral da história», deixo aos nossos leitores a oportunidade de dizerem qual é.
O nosso blog agora está preparado para aceitar comentários.
Aguardamos!