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Do «Canto da Rola» até a Ilha da Berlenga leva vinte e cinco minutos de carro e depois quarenta e cinco de barco. Alguns receios de viajar em barcos (relativamente) pequenos fizeram com que a nossa família não se metesse na aventura de uma ida à ilha, durante os 18 anos desde que moramos na zona de Caldas da Rainha.
Mas algum dia tinha que ser! E a altura foi para celebrar o facto de o Andrew recentemente ter feito 24 anos: o nosso dia (ontem) incluiu até uma refeição no restaurante da ilha.
Os abanões no mar foram razoáveis – mas suportáveis. Fomos informados de que há dias muito piores!
As vistas da ilha; do Forte de João Baptista; das grutas e canais; da impressionante fissura central (Carreiro dos Cações); das «Estelas» e «Farilhões» - que dão vontade de fazer ainda mais outras viagens – são espectaculares. A recomendar a sério! As cinco horas, entre a chegada do barco e a sua partida à tarde, chegam muito bem para dar uma volta à Berlenga e a Ilha Velha.
Mas o que talvez tenha impressionado mais – e não num sentido completamente positivo – foram as gaivotas. Praticamente só conhecia esta ave em situações em que ela se sente em minoria. Quando se junta um número delas, numa ilha só, que (imagino) pode ser comparável ao número total de habitantes humanos de Portugal, coexistindo nesse lugar com um número de seres humanos muito reduzidos, a situação é bem diferente! Estender-nos num canto sossegado, para dormir a sesta, por exemplo, torna-se completamente impossível. Em alguns lugares o cheiro do estrume das gaivotas é insuportável, fazendo lembrar capoeiras enormes.
O comportamento extremamente pacífico que eu associava com esta ave afinal é só uma faceta da realidade! Para conhecer outra faceta não encontrei nada melhor do que a seguinte frase da Wikipedia (tradução minha):
«As gaivotas – e especialmente as espécies maiores - são aves expeditas, curiosas e extremamente inteligentes, que demonstram métodos complexos de comunicação e uma estrutura social altamente desenvolvida; por exemplo, muitas colónias de gaivotas manifestam comportamento amotinador, atacando e acossando todo o predador e outros intrusos».
Quando ouvimos primeiro algumas reacções extremamente frenéticas de parte delas, não nos sentimos assustados. O facto é que estávamos a mostrar alguma curiosidade em ver os seus ovos e as gaivotas recém nascidas - e sabemos que o instinto materno pode alterar o humor de qualquer fêmea!
Isto até ao momento em que fui directamente atacado – na cabeça – por uma delas! Não houve consequências de maior – mas, sem dúvida, foi uma lição sobre o comportamento desta espécie, de que não me irei esquecer!
E, embora me sentisse injustiçado (!), tive que reflectir mais uma vez sobre a relação entre o pecado humano e a criação que geme (Romanos 8:22). Lembrei-me de histórias de pescadores que, em lugares assim, estrelavam os ovos das gaivotas – e da falta de escrúpulos de coleccionadores (como eu, na minha infância!) de ovos das aves.
A maldade humana termina por ser muito mais subtil, variável e devastadora do que as reacções de defesa de outras espécies que por vezes nos atingem.
O dia na Berlenga terminou muito bem. O ataque da gaivota foi só um pequeno episódio passageiro – embora para mim uma surpresa estranha.
Gostava de convidar aqueles dos leitores do blogue que percebem mais do que eu de questões de ecologia a reagirem!