17 julho 2010

Guardar o coração

O «coração» que devemos guardar será isto?


Ou será isto?



Há dias, no culto de encerramento do ano lectivo do Seminário Baptista (3 de Julho), preguei sobre Provérbios 4:23. O André Fonseca estava a dar testemunho da sua experiência como estudante e a agradecer os apoios recebidos. Recebeu o diploma de bacharelato e tem o plano de ir agora assumir a liderança de uma igreja baptista brasileira em Oxford.

Tenho muita amizade e muito respeito pelo André. Mas conheço o seu «coração»? Ele conhece o meu? Sou tentado a dizer que sim. Curiosamente o André cortou o meu cabelo por duas vezes, mesmo nas instalações do Seminário (não conheço nenhuma outra situação em que as instalações do Seminário tenham sido usadas assim!). Estava a tirar um curso de cabeleireiro e queria praticar. E era, também, a sua maneira de expressar a sua gratidão pelo apoio que lhe estava a dar – algum, inclusive, na língua inglesa. Que vai precisar...

 
Não, não é uma fotografia do André!Nem sou eu!
Mas, o que me chamou a atenção é que ele, como cabeleireiro, melhorou bastante da primeira vez para a segunda. Bom sinal. Mostrou-se bastante perfeccionista. Não era só uma ocupação para ganhar dinheiro. Bom, também. Inclusive disse-me que às vezes fala da sua fé com os clientes. Acho que é bom sinal também.

Mas conheço o «coração» do André? Segundo Jeremias 17:9-10, não é mesmo possível alguém, sem ser Deus, conhecer o coração humano. Isso significa que posso nem sequer conhecer o meu.

Espero poder desenvolver este tema em várias postagens – o resumo, com alguns acrescentos, daquilo que apresentei em Tires naquele sábado à tarde. Tive algumas surpresas enquanto preparei a mensagem.

E o vosso «coração»? Como vai?
 

24 junho 2010

Que tal umas férias diferentes em família?

Queremos convidá-lo a disfrutar do Canto da Rola, um centro cristão de estudo e retiro perto de Caldas da Rainha.

Horas seguidas na praia são o encanto de alguns, mas saturam outros...





Como, de resto, os monumentos históricos.
("Quero lá saber de que seculo é, ou se o D. Pedro e a Inês estão lá sepultados!")





Há quem goste de subir montanhas - conhece as serras de Candeeiros e de Montejunto?






E há quem prefira o mar - vai um pulinho à Berlenga?






Uns gostam imenso de ler,





mas alguns já não se separam do seu portátil.







Provavelmente, nenhum de vocês pensou em dedicar algumas horas das férias a trabalho voluntário...

Mas pode haver alguém na tua família que prefira fazer algo de que tu não gostas.



Por isso, o ideal é tentarem conciliar tudo.
E que sítio melhor para isso do que o Canto da Rola?

É uma vivenda com um segundo andar com acesso independente, ideal para uma família passar uma semana.
No primeiro andar o casal Alan e Celeste Pallister, vivem e têm muito gosto em combinar tempos para vos conhecerem, ou para «pormos a conversa em dia»...
A biblioteca do Centro está à vossa disposição.
E podemos dar-vos tarefas manuais - se quiserem, claro!

As praias ficam entre 5 e 15 kms.
Os monumentos históricos entre 12 e 40 kms.
As serras (dos Candeeiros e Montejunto!) a cerca de 30kms.
E o Bairro Alto de Lisboa (se tiverem saudades!) a uns meros 100kms.

Isso para não esquecer a Berlenga. Peniche fica a uns 40 kms. Os barquinhos são muito bons e as gaivotas na ilha são abundantes.

Não cobramos a estadia no Centro como se fosse pensão, mas sugerimos que uma família possa dar
um donativo de €7,50 por pessoa por noite, para ajuda das despesas do Centro. Este valor não inclui refeições, mas o 2º andar tem uma cozinha à disposição das visitas.

E o tal equilíbrio que procuraram sempre para os diversos interesses na família... quem sabe se não o vão encontrar aqui?
E quem sabe se Deus não vos vai dar uma experiência nova, através do num Centro que outros se esforçaram para pôr à disposição para vos servir?
Ainda temos semanas disponíveis este verão!

Contactem-nos:
O Canto da Rola
Rua Central, n.º 35, Mouraria
Tornada, 2500-304 Caldas da Rainha
262-844049 ou 93-431-8515.
alanpallister@clix.pt

14 junho 2010

Andas à procura de férias LOW-COST em Agosto?


Esquece, já não vais a tempo...


A menos que escolhas um destino diferente...


Viagens LOW-COST todo o ano










Do Porto: €26,40*
*preços de ida e volta com cartão jovem; já inclui TODAS as taxas


Alojamento LOW-COST - só em Agosto!
Se fazes questão
de aproveitar o
Verão para ir à praia,





mas não te
importas de cavar,







de lavar a loiça
ou limpar o chão,






ou de expressar a
tua criatividade
pintando paredes,








podes ficar no Canto da Rola de 9 a 13 de Agosto por apenas €48*.
*Este valor inclui alojamento, pequeno-almoço, almoço e jantar.


Além disso, é uma oportunidade de enriqueceres os teus conhecimentos através de uma tecnologia inovadora (vê o vídeo!)

E também teremos debates e alguns estudos.


Se calhar muitas coisas são parecidas com as que tens que fazer em casa... mas numas férias low-cost, num lugar diferente e bonito e com um grupo de amigos, tem outro sabor!

Contactos:
John Pallister: 933617265 / 911039717 - longobedience@gmail.com
Alan Pallister: 262844049 / 934318515 -
alanpallister@clix.pt

25 maio 2010

Voar mais alto?

Voar mais alto?

Quando tinha 19 anos (lá em 1970), queria voar mais alto. Era recém convertido a Cristo, mas achava que o meu feitio introvertido não servia para falar com os outros acerca da minha fé.
Estava num pequeno núcleo de estudantes (o «GBU») de Cambridge. E o meu «college» tinha uma alta percentagem de filhos da classe alta... cujos pais em tempos tinham estudado no mesmo «college». Vindo de uma família modesta de agricultores, sentia-me deslocado.
Dentro de pouco tempo, percebi que havia dois tipos de crentes no grupinho. Os crentes «normais», evangélicos conservadores (anglicanos, baptistas, Irmãos, etc.) e os crentes «baptizados pelo Espírito». Estes normalmente não eram das denominações pentecostais mas sim dos movimentos «carismáticos, que surgiam nas mais diversas denominações – e mesmo na Igreja Católica. Como alguns juntavam à sua experiência de baptismo no Espírito e línguas o serem extrovertidos, e estarem à vontade nos mais diversos meios sociais, eu julgava que estes espiritualmente voavam mais alto. Fiquei com uma vontade enorme de «voar» com eles, especialmente como um que estava na mesma Faculdade que eu e com quem, durante um tempo, tive bastante amizade.
A ideia era mais ou menos assim: alguns crentes têm apenas Cristo, e o Espírito Santo a morar neles, mas falta-lhes poder. Precisam de uma libertação – de um «baptismo» que os faça rebentar as correntes da sua personalidade – e comunicar com todos com brio e vivacidade. Outros têm Cristo e «mais qualquer coisa».
Depois de apreciar com o meu colega as passagens bíblicas de Actos dos Apóstolos que mostram o poder com que os apóstolos testemunhavam de Cristo, pedi para ser baptizado assim. E senti alívio e alguma exuberância. Falei línguas, mas apenas para mim – não me atrevia mesmo assim a fazer isso em público.
Foi bom ou não foi, ter passado por essa experiência? Julgo que o esforço determinado de procurar mais de parte do Senhor, de procurar de coração ser cheio do Espírito, é bom.
Por outro lado, a sensação de ter subido para um patamar superior de espiritualidade, fazia com que me sentisse superior a outros crentes ao meu lado. Superior àlguns que de facto eram aqueles que mais me ajudavam. Superior, inclusive, aos conhecidos pregadores que vinham dar a exposição semanal. Durante um tempo cheguei ao ponto de achar que tinha pouco a aprender dos Drs. John Stott e Jim Packer. Que vergonha! Queria era ouvir alguém «cheio do Espírito» (e esse não eram): um Oral Roberts, se tivesse vindo, talvez me servisse!
Percebi afinal que estava a cultivar uma ilusão. Estava a querer mudar a minha personalidade. Estava a partir da base de que a minha maneira de ser introvertida era inferior ao temperamento extrovertido do meu colega. Como serás evidente, não mudei de personalidade e, depois de algum tempo, tive que constatar que era eu, tal como era, com quem Deus desejava fazer a Sua obra: não um «eu» modificado, modelado com base numa personalidade diferente. E, da forma que a minha personalidade permitia, pude testemunhar de Cristo entre os meus colegas.
Tive que constatar que, para tudo o que Deus quisesse fazer na minha vida, Cristo era suficiente. E procurar dEle, diariamente, a plenitude do Espírito, não imaginando que pudesse de repente ser catapultado para outro nível em tivesse «Cristo mais alguma coisa», não imaginando que precisasse de ficar livre do meu temperamento que, afinal, era um dom precioso de Deus.

04 maio 2010

Miopia evangélica....

A nossa equipe de pregadores na igreja acaba de terminar uma série de mensagens expositivas sobre Apocalipse. A parte do trabalho que me competiu foi expor, entre outros capítulos, o 17 (prostituta de Babilónia - ver última postagem) e 21 (nova Jerusalém).

Desta vez, tendo entregue Apoc. 20 a um membro da equipe, fiquei livre de me pronunciar sobre o velho problema do milénio! Alguns anos atrás mudei de «a-mil...» para «pré-mil...» - mas, sinceramente, o debate já não me parece tão importante - facto este que a minha última turma no Seminário a tratar da escatologia deve ter percebido!

Mas, agora, Apocalipse 21! Fala sobre uma cidade que de Deus desce para a terra (v.2). Fala sobre a transformação de todas as coisas - «novos céus e nova terra em que mora a justiça». É o último e supremo cumprimento do propósito de Deus para o universo que criou: nenhum «a-m...», «pré-m...» (histórico ou dispensacionalista) ou «pós-m...» pode negar este facto central da esperança do cristão para o futuro. É tão central para a Bíblia como o é a doutrina da ressurreição do corpo, ensinada em João e nas epístolas de Paulo, em cumprimento das promessas do V.T.

As implicações ecológicas desta promessa são espantosas. Só se consegue explicar a indiferença histórica dos cristãos a problemas ambientais por uma miopia grave generalizada relativamente a esta doutrina bíblica.

Quando vamos ver hinos e cânticos nas nossas colectâneas, vemos os sinais mais flagrantes desta miopia secular, resultado naturalmente da infiltração de ideias gregas na doutrina cristã. Praticamente todos os hinos do Cantor Cristão e o Hinário para o Culto Cristão, por exemplo, falam como se a suprema esperança do cristão fosse a ida da sua alma para morar eternamente no céu (a fase que a teologia chama apenas a intermediária). Chegam ao ponto de lamentar o nosso apego às coisas belas da criação de Deus!

E nesta área os coros mais novos pouco ajudam. Inovadores na sua melodia e ritmos, muitas vezes são tradicionalistas e limitados no seu conteúdo.

Onde se encontram ecos, no suspiro do cristão para o cumprimento de todas as coisas, das palavras de Paulo... que diz que não desejava ser despido mas revestido (2 Cor. 5:4) para que o mortal fosse absorvido pela vida?

Miopia evangélica


17 abril 2010



ACERCA DA PROSTITUTA DA BABILÓNIA...

Não era exactamente o texto que teria escolhido para um culto em que uma bebé ia ser apresentada ao Senhor!

Mas, seguindo a prática na nossa igreja de pregação expositiva, capítulo por capítulo, chegámos no dia 11 deste mês ao capítulo 17 de Apocalipse!

Veio-me a ideia de relacionar os temas de dinheiro, sexo e poder (cf. livro de Richard Foster, com esse mesmo título) – tão graficamente apresentados aqui na figura da prostituta – com o tema do «idiota», principal personagem do famoso romance de Dostoievski. Numa certa altura o autor faz a seguinte avaliação do Príncipe Miushkin:
«Ele não se importava com pompa ou riqueza, nem mesmo com estima pública, mas importava-se apenas com a verdade».

Quem questiona marginaliza-se. A alta sociedade russa do século XIX sentia-se na necessidade de classificar como “idiota” uma pessoa ingénua e generosa, mas que se preocupava sobretudo com a verdade...

O cerne da minha mensagem no culto do dia 11 foi muito simples. O problema real de Miushkin era a sua perspicácia: era o facto de ele ver a realidade à sua volta e analizá-la com inteligência. Não se deixava ludibriar pela «prostituta». Quem segue a prostituta, prostituindo-se com os valores do dinheiro, do sexo e do poder, fá-lo só porque não analisa correctamente a realidade, nem o verdadeiro resultado das coisas. Quer acreditar que o dinheiro e o prazer sexual extra-conjugal trazem felicidade: mas não se detém na análise de vidas vividas com estes objectivos que terminam na frustração e na tragédia. Por norma não consegue encontrar nem sequer um exemplo de uma pessoa a quem a «prostituta de Babilónia» tenha trazido algum prazer ou benefício reais. Mas abraça-a mesmo assim, fechando os olhos para a realidade e, como quem se embriague, quer convencer-se que é assim que uma pessoa se torna feliz.

Fechar os olhos – e agir com base numa ilusão – é o que o transforma num verdadeiro «idiota».

Também focámos o facto de os dez reis, a quem a mulher dá temporariamente algum poder, se terem virado contra ela (v.16). Os valores da Babilónia destruem-se a si próprios. E é o Deus soberano que usa estes reis para cumprir os Seus propósitos de julgamento.

Apocalipse 17 é bastante drástico! Divide o mundo entre dois tipos de pessoa: aquela que questiona ou rejeita os valores da Babilónia e é chamada «idiota» e aquela que os abraça e realmente é «idiota».

A palavra «idiota» não é bíblica, é verdade! Mas, no fim do sermão, lembrei as pessoas que Deus, nas palavras de Paulo, escolheu «as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias» (1 Cor. 1:27). Afinal a ideia de João e a de Paulo são iguais. Se nos preocuparmos sobretudo com a verdade seremos chamados «idiotas» por causa disso. Mas não valerá a pena?

03 abril 2010

Um outro Calvino, «bullying», outros «infernos» e como fugir deles......

Hoje, na véspera do domingo da Páscoa, mando uma cópia de um artigo publicado no boletim da nossa igreja e na «Gazeta das Caldas». A série de «retalhos da vida de um pastor» provavelmente vai parar por enquanto: mas a história não está completa - e podemos sentir-nos motivados a continuar de aqui algum tempo. Feliz Páscoa a todos de
Alan Pallister.


Encontrei este pensamento no último parágrafo de um intrigante e estranho romance italiano: «As Cidades Invisíveis» de Italo Calvino (1972).
Depois de o explorador Marco Polo descrever cidades imaginárias para o Grande Imperador Kublai Kan, afirma que «o inferno dos vivos não é uma coisa que virá a existir; se houver um, é o que já está aqui, o inferno que habitamos todos os dias, que nós formamos ao estarmos juntos». À parte todos os problemas que afligem a humanidade, tais como terramotos, tsunamis e doenças, há também aqueles que o ser humano inflige ao seu próximo, pensando que aquilo que faz é bastante normal e facilmente perdoável: a fraude, a mentira, o adultério, a intriga..... Quem não sabe que podemos passar dias que são um “inferno” por causa de alguma deslealdade de um amigo ou familiar? Um episódio de «bullying» numa escola, por exemplo, é suficiente para mergulhar um adolescente na mais profunda angústia e, como sabemos de notícias recentes, levá-lo ao suicídio.
O livro «As Cidades Invisíveis» não faz qualquer referência à perspectiva cristã. Mas, diz Polo, «Há dois modos para não o sofrermos....» (isto é, o inferno que as pessoas vivem aqui). «O primeiro torna-se fácil para muita gente: aceitar o inferno e fazer parte dele a ponto de já não o vermos».
Considerando como cristão esta afirmação que faz, tenho que confessar que concordo bastante. A experiência da vida traz desgostos – alguns causados pelos outros e alguns (muitos até) por nós próprios. Chegamos à conclusão de que não há nada a fazer. Se alguém me engana, tenho que sobreviver – então irei enganar outros. Quantos cônjuges, para se vingarem das infidelidades dos seus parceiros, não se envolveram também no adultério? Sofrem duplamente – e sofrem aqueles que não têm culpa, nomeadamente os filhos. O “inferno” vai-se ampliando à volta da pessoa e de todas as suas relações familiares. E, até no inferno, imagino que muitas das conversas das pessoas serão para se justificarem a si próprios: «O que os outros fazem, eu também tenho direito de fazer.....».
Se formos perguntar a esta pessoa, ainda viva, se está no “inferno”, provavelmente irá dizer que não. Quer convencer-se de que a vida ainda é um lugar melhor do que isso.... mas, até para si própria, as palavras soam ocas!

O segundo modo que Marco Polo propõe – embora dizendo que «é arriscado e exige uma atenção e uma aprendizagem contínuas», é «tentar e saber reconhecer, no meio do inferno, quem e o que não é inferno, e fazê-lo viver, e dar-lhe lugar».
Nunca imaginei que um livro que não faz referência ao cristianismo terminasse com frases tão interessantes!

Cada Páscoa as igrejas cristãs convidam-nos a reflectir sobre aquilo na vida que “não é inferno”. Uma leitura dos Evangelho leva-nos à reflexão sobre uma pessoa que não só ensinava a amar o próximo, independentemente de classe ou raça, mas que também praticava esse ensino – até ao ponto de incluir, ao lavar os pés dos discípulos, o traidor Judas. Onde uma pessoa age assim, creio que posso afirmar categoricamente, que não é “inferno”.
Quando posteriormente os seguidores de Jesus, como os Actos dos Apóstolos relatam, procederam da mesma forma – o mártir Estêvão, por exemplo, pedindo perdão para aqueles que o apedrejavam, creio que posso igualmente afirmar também que não é “inferno”.
Não valerá a pena tentar saber quem é que pode fazer viver esta atitude? Não valerá a pena investigar se, no meio das muitas igrejas que hoje se chamam cristãs, não há algumas que, sendo fiéis aos ensinos e exemplo do Seu fundador, procuram de todo o coração viver aqui de acordo com eles? Não iremos encontrar alguns espaços no mundo pós-moderno e traidor em que vivemos, que «não são inferno»? Igrejas perfeitas não iremos encontrar: igrejas em que o desejo prevalecente – e que dão pelo menos algumas expressões práticas disso – acredito que iremos encontrar... e em muitos lugares!
Na minha convicção isto é porque Jesus ressuscitou a seguir à Páscoa judaica, e, tendo ressuscitado, deu vida nova a todos os que lhe «davam lugar» .... isto é que o aceitaram com confiança e com um compromisso claros.
Em vez de aceitar o “inferno” e fazer parte dele, não será melhor procurar com sinceridade algum pequeno espaço que não seja “inferno” e tentar viver nele? E não será melhor, sobretudo, procurar maneira de que seja retirado o “inferno” que está no íntimo de cada um de nós, pedindo isso Àquele que viveu sem pecar e que morreu para nos dar o perdão e oferecer a Sua salvação?

Aqui vai o meu desafio. Visitem uma igreja esta Páscoa. Sugiro que comecem com alguma daquelas que se chamam «evangélicas» - por causa do compromisso que assumem com a Bíblia.

15 março 2010

Filhos (3)

As pessoas que iniciaram o primeiro processo de «libertação», já em 1993, diziam que o nosso problema era que não tínhamos jeito para o trabalho com jovens. Acredito que a saída de muitos jovens da igreja nesse ano tenha sido ainda mais por influência desses adultos do que por vontade dos próprios jovens!
Quase todos os amigos que o Ricardo tinha feito, por exemplo, saíram. Alguns terminaram por associar-se a uma igreja «carismática»; a maioria deixou de frequentar qualquer igreja.
Entretanto, poder-se-ia pensar que, tendo eu o ministério de ensinar no Seminário, e tendo nós os dois trabalhado durante anos com o Grupo Bíblico Universitário, tínhamos da parte do Senhor pelo menos alguma capacidade nessa área. Mas o problema dos nossos críticos era o facto de querermos definir limites, ensinando os jovens claramente, por exemplo, a não se envolverem em namoros com pessoas que não eram crentes. Os outros «sabiam» que era preciso, em tempos como estes, a igreja ser mais «tolerante».
Quando, em 1998, os dois grupos da oposição se uniram, para fundar uma nova missão, era em boa parte para tentar juntar os jovens de novo. Estes dois grupos nunca conseguiram relacionar-se bem um com o outro. A «missão» tem continuado a funcionar desde essa altura, agora estando reduzida a um grupo diminuto de pessoas de bastante idade. Tem tido o apoio de uma outra igreja da zona – situação com a qual manifestámos a nossa discordância desde o princípio sem, por isso, deixar de nos relacionarmos com essa igreja.
Houve situações trágicas com alguns jovens das famílias em questão – situações que não queria comentar aqui, por respeito à dor que essas famílias sofreram.
Entretanto os nossos filhos mantiveram-se na igreja, primeiro sendo «levados» pelos pais e, depois, seguindo da sua própria vontade. Encontraram muito apoio em trabalhos como o GBU. Alguns passaram fases «carismáticas», querendo outro estilo de culto. Nenhum prejuízo veio daí: o que puderam aprender de outros lados, aprenderam. Aprenderam a dar, também, valor à exposição da Palavra na nossa congregação – um tipo de ministério que se encontrava pouco, mesmo no meio baptista.
Por respeito a eles não conto aqui algumas das situações incómodas que surgiram – pela graça de Deus não me parece que tenham sido mais prejudiciais do que as que surgem na vida de quaisquer adolescentes.
Agora, como muitos leitores deste blog sabem, dois estão casados com crentes dedicados. A Laura Beswick passou a ser «Pallister» também – e o John (que costumes!) passou a ser «Beswick»! A Lilian passou a ser «Calaim» também – e o Luís (como é que isso poderia ser?) passou a ser «Pallister»! O Ricardo trabalha esforçadamente com crianças e adolescentes na igreja e o Andrew continua a estar envolvido também.
Têm vindo novas famílias à igreja, que não sofreram esses problemas e, neste momento, há um trabalho com adolescentes e crianças com muito dinamismo.
Para os leitores deste blog que conhecem a Bíblia, não será preciso dizer onde é que se encontram passagens que asseguram que, quando criamos os filhos para aceitarem e obedecerem a Palavra, Deus nos honra. Durante muito tempo na nossa casa houve a sensação de que as intrigas e os telefonemas na altura das refeições, de pessoas da igreja, envenenavam o ambiente. Mas foi Deus, muito mais ainda do que a igreja, que cuidou dos Seus filhos. Na lógica de Romanos 8:28, Ele trabalhou para o bem dos Seus, mesmo através desses telefonemas e intrigas!

24 fevereiro 2010

Filhos (2)

E, agora, a parte financeira!
Acontece que a nossa família tinha uma característica que complicava ainda mais a situação. A minha esposa, sentindo-se também vocacionada para o ministério na igreja, e tendo uma parte indispensável nele, não recebia salário. O meu salário teria sido suficiente para uma pessoa. Numa altura, perante as pressões, a Celeste aceitou uma colocação numa Escola próxima, para ajudar de maneira ao «barco» não se afundar.
O facto é que a experiência não correu bem – nem a nível da escola, nem a nível da família. Antes os filhos podem ter desejado estar só com o pai: depois perceberam que o pai, envolvido em muito trabalho e ausente uma parte do tempo no Seminário, não podia dar-lhes o apoio que precisavam.
Durante um tempo valeu-nos o produto da venda de uma propriedade, que tinha vindo da herança dos meus pais. Valeu-nos durante o tempo todo o valor que recebia pelas aulas que ministrava no Seminário Teológico Baptista. Valeu-nos também o facto de amigos que recebiam cartas circulares nossas – uma vez que éramos associados (isso é, sem sustento certo) da Missão Cristã Europeia – enviarem ofertas ocasionais. Normalmente era num momento de grande aperto que chegavam estas ofertas, e de uma forma inesperada. Valeu-nos também as pessoas na igreja (mesmo aquelas que passaram a ser «da oposição») nos oferecerem alimentos da sua lavra.
É verdade que os filhos se queixavam do facto de não terem o nível de vida que os seus colegas tinham. Na nossa família também eram feitas as habituais queixas, pela nossa roupa não ser «de marca»! Por outro lado valorizavam férias em família, no campismo, privilégio que muitos dos seus colegas não desfrutavam , mesmo em casos em que os pais ganhavam muito mais. (Uma vez as nossas férias, no parque de campismo de Góis, foram perturbadas por notícias da igreja recebidas por telefone – quando a «oposição» aproveitou a altura para preparar um abaixo assinado, preparando para a reunião que iria exonerar-me. Mesmo assim, acredito que os filhos tenham gostado dessas férias – talvez mais do que nós!).
Sofreu-se muito aperto para eles poderem seguir com os seus cursos superiores! Mas seguiram. E todos, menos o último, já acabaram! E as propinas foram pagas, graças em parte também as bolsas que receberam.
Os temperamentos são diferentes. Acredito que alguns deles tenham sentido mais a experiência de aventura envolvida numa vida assim – e que outros preferissem na altura não ter que passar por esses apertos e peripécias. Mas acredito também que, depois, souberam dar mais valor àquilo que lhes vinha – do trabalho, mesmo do serviço evangélico de tempo integral (no caso de um dos quatro) – graças a essas dificuldades. Também a sua família manteve-se unida: muitas vezes viram grande sofrimento nas famílias em que os pais, mesmo ganhando muito melhor, tinham problemas de relacionamento ou se divorciavam.
Creio contudo que, hoje, se eles citarem Romanos 8:28, não será para manifestar uma atitude de revolta ou ironia. Alguns com mais entusiasmo do que outros – mas creio que todos poderão confirmar que este texto expressa a verdade que experimentámos!

17 fevereiro 2010



Teremos algumas leituras de textos de pensadores políticos e depois muita troca de ideias a partir deles e com a ajuda destas pessoas:
Tiago Aragão - responsável da aepjovem, advogado, pastor da Acção Bíblica de Sesimbra, deputado municipal pela CDU em sesimbra.
Joaquim Mateus - ex-líder do PSD norte, presidente da Junta de Freguesia de São João da Madeira, empresário, ancião na igreja de Cucujães.
Marta Gomes - professora, igreja dos irmãos de Coimbra, líder distrital do PS Coimbra
Trajano Martins - líder de jovens da igreja dos irmãos de Sangalhos, assistente social na Misericórdia do centro, candidato não eleito pelo CDS a presidente da Junta de Freguesia de Sangalhos
Samuel Cerqueira - economista, assessor na Segurança Social nacional, pensador de esquerda

13 fevereiro 2010

Sacudir o pó?

Ainda antes de seguir, com «Filhos 2», parece-me que a resposta do Samuel (Nunes) merece uma resposta específica. O Samuel diz que é bíblico um pastor sair de uma igreja em que as pessoas não o desejam, sendo este o princípio de «sacudir o pó das sandálias» (ou dos «pés»!).

Pode acontecer o Samuel e o Tó-Zé Queiróz, que tiveram a amabilidade de manifestar as suas opiniões, terem lido algumas postagens e não outras anteriores e, dessa maneira, não terem percebido que estava a contar acontecimentos de 10 anos atrás. Como vivo feliz agora, na mesma igreja (mas sem a presença dos destabilizadores), não me parece que venha muito a propósito discutir se teria sido «bíblico» ou não sair, em 1998 ou antes! Naturalmente na altura, sair teria sido uma das opções «bíblicas» possíveis: permanecer também acho que era. Acontece que o Senhor nos ajudou a compreender que sair não era a Sua solução, na situação específica – e que dez anos da história posterior da igreja deram-nos muitas razões para confirmar isso.

Sair, como Samuel diz, seria uma forma de «sacudir o pó». Mas Jesus deu este conselho aos doze discípulos, quando estes fossem para determinadas terras judaicas que não aceitassem a mensagem do reino. Não o deu a pastores que fossem nomeados para cuidar de igrejas já estabelecidas. Para estes acho que os conselhos de Paulo a Tito (1:5-11) viriam mais a propósito. O método bíblico para tratar dos insubordinados é tentar ensinar, persuadir, repreender e, em última análise disciplinar. Isto por amor aos que fazem parte da igreja e sinceramente desejam fazer a vontade do Senhor, mesmo que estejam temporariamente na minoria.

Cada postagem que escrevo constitui uma pequena parte da história. Mais para a frente quero salientar o facto de o Senhor nos ter concedido o privilégio de podermos disciplinar aqueles que precisavam dessa disciplina e assim, daí para a frente, termos uma igreja que, com todas as suas limitações, era e é digna do nome de igreja. O objectivo de Jesus é «santificar a igreja, tendo a purificado com a lavagem de água, pela palavra» (Efésios 5:25). O preço que pagou, em termos de sofrimento injusto, foi muito maior do que os incómodos que eu e a minha família sofremos. Mas foi Ele que nos deu o privilégio de nos sentirmos parte do seu próprio sofrimento – com objectivos semelhantes.

Pusemos a nós próprios, em várias alturas, diante do Senhor, a hipótese de sair. Colegas aconselharam a nossa saída. Cada vez parece que algo bloqueou essa hipótese: creio que foi o próprio Deus que a estava a bloquear.

A história posterior confirmou que Ele tinha dirigido assim. Se algum colega, confrontado com problemas semelhantes, sai de uma igreja, não reprovo a sua opção. Mas também creio que haverá igrejas em que – como foi no nosso caso – vale a pena lutar e sofrer - um pouco - para que haja mudança a longo prazo.

É verdade, como diz o Samuel, que as igrejas filiadas na Convenção Baptista sofrem dificuldades, algumas vezes, por causa de algumas limitações do sistema democrático. Mas outras igrejas também as sofrem. E igrejas menos democraticamente organizadas também as sofrem – sempre quando há pretensos «donos» que querem facilitar em questões de doutrina ou ética bíblicas. O Samuel tem razão em dizer que os pastores de outras igrejas às vezes erram em dar a sua «bênção» à causa destes elementos.

Obrigado aos que responderam! É bom poder continuar a contar a história – mas com estas interrupções, para poder reagir ao que alguns leitores vão comunicando!

06 fevereiro 2010

Filhos....

Nos meus «retalhos» já cheguei ao ponto de descrever, em linhas gerais, o processo envolvido na segunda tentativa de membros da nossa igreja se «libertarem» do nosso ministério incómodo.
Mas, alguém pode estar a pensar: «vocês – Alan e Celeste – tinham uma vocação de parte de Deus para estarem nesse lugar. E os filhos? Eles foram por vocação? Tendo sido arrastados para uma igreja em que muitos elementos não iriam respeitar a pessoa ou o ministério dos seus pais, como é que eles poderiam atravessar as crises, sem ganhar uma aversão total para o “ministério evangélico” em que os seus pais estavam comprometidos. E mesmo para a igreja em que se encontravam, mas sem ser por escolha própria?
E, na parte financeira, havendo essa redução drástica do salário, relativamente àquela que inicialmente nos tinham dito, como é que os filhos poderiam completar o ensino secundário e universitário, sem ser numa situação de pobreza extrema e sem sentir uma grande revolta como consequência?
Gostava de dar algumas respostas a estas questões hipotéticas – questões que nós já nos colocámos muitas vezes na altura. Por respeito a cada indivíduo que faz parte da minha família, vou falar em termos bastante gerais.
Em primeiro lugar, é verdade que os filhos sentiram a mudança, uns mais do que outros. O Ricardo, já adolescente, sofreu pela separação dos seus colegas de escola e igreja, de Coimbra. A Lilian e o John sentiram a dificuldade própria de terem que mudar de escola duas vezes. (O Andrew era demasiado pequeno nessa fase para notar o problema). Mas, como é óbvio, este tipo de situação surge muitas vezes com outros tipos de mudança que os pais têm que fazer, sem ser só mudanças por causa do ministério numa igreja.
Em segundo lugar, a vida da igreja sempre teve a sua parte positiva. Experiências agradáveis foram vividas em muitas ocasiões, houve convívios e boas lições foram dadas, mesmo por pessoas que depois entraram em conflito. Nos sermões acredito que tenham aprendido algumas coisas, uma vez que o método expositivo pode ter valor não só para adultos mas para os mais novos também. No culto doméstico (quando não descuidávamos!) foi possível manter a comunicação na família, tentando explicar de algumas maneira quando as situações estavam a «azedar».
Na altura do voto em 1998, para decidir se eu ia ser exonerado, havia uma sensação entre nós de companheirismo na luta. Tendo sido o voto por escrutínio secreto, não posso afirmar categoricamente que todos os filhos tenham votado a favor da nossa permanência! Se algum estava tão cansado da luta que votou contra, posso manifestar aqui a minha compreensão para ele. Mas há qualquer coisa que me diz que eles devem ter apoiado a nossa permanência, compreendendo, no mínimo, que era importante para nós, os pais, seguirmos a nossa vocação e (quem sabe?) talvez vislumbrando um futuro melhor, mesmo para eles, de acordo com as promessas de Deus.
Sobre a parte financeira, espero falar na próxima postagem.

19 janeiro 2010

Instalações - ou um obreiro?

Parece que as novas instalações tinham mesmo que ser feitas! E parece que o pastor tinha que ficar mais um tempo em Caldas da Rainha!

Mas, para poder servir o Senhor, que nos dirigia neste sentido, o pastor chegou a emprestar, sem juros e sem data prevista para a amortização, todo o restante valor do que tinha recebido da herança dos pais, sendo este dinheiro administrado, temporariamente, por pessoas que o acusavam de estar a desviar fundos da mesma igreja! Note-se bem: emprestei à igreja, sendo Jesus o Senhor dessa igreja – não emprestei a indivíduos que, temporariamente, estavam na liderança.
Também foi possível a igreja receber um empréstimo da Convenção Baptista Portuguesa, este com juros e prazos estabelecidos para a amortização, e depois um reforço do mesmo empréstimo.

Igrejas e indivíduos a quem dirigíamos cartas apelando por ajuda surpreenderam-nos com a sua generosidade. Poucos deles eram do estrangeiro: o valor que entrou de dentro do país deve ter sido bem mais do que 90% do valor total. Num ano só (1996, se não me engano) entraram ofertas de mais de 3.000.000 escudos (o equivalente de 15.000 euros) para o nosso fundo de obras.

Mesmo assim, as entradas mensais não estavam a cobrir bem as despesas – facto este que o tesoureiro queria usar para que a igreja decidisse despedir o pastor. Cheguei a prescindir do salário de um mês inteiro, confiando na provisão do Senhor de outras maneiras, para que a situação não desequilibrasse. O tesoureiro naturalmente não agradeceu – a vontade dele era que a situação desequilibrasse mesmo!

A igreja agora decidiu que a residência pastoral seria prioritária. Mantivemos esta posição, uma vez que se tratava de uma decisão tomada em assembleia de igreja. Mas aqueles «líderes» que tinham vindo a desejar a nossa saída tentaram, particularmente com o empreiteiro, trocar novamente a ordem de prioridades para que o salão de cultos fosse terminado primeiro. Quando chegou a altura em 1998 de mudarmos para a residência, livrando-nos finalmente da renda pesada que tínhamos estado a pagar, a mudança estava a ser boicotada activamente e estava a ser realizada uma «campanha» de difamação, cujo ponto principal era que o pastor tinha desviado algum dinheiro que entrara para a igreja da Convenção Baptista. Em visitas aos crentes que se iam desencorajando com todo este ambiente, íamos tendo conhecimento de um activo duo de visitadoras que ia «adiante» de nós. Curiosamente uma delas era a mulher do tesoureiro e a outra a sua inseparável amiga «sem papas na língua»!

Como quem acusava o pastor de desvio de fundos era tesoureiro, era natural alguns membros da igreja acreditarem! Mas devo afirmar aqui que a acusação era totalmente falsa, não tendo eu feito nada que pudesse nem sequer remotamente ser considerado desvio.

Aproveitando uma altura de férias organizaram um «abaixo assinado», a ser votado em reunião extraordinária da igreja, exigindo a exoneração do pastor.

Tentativas feitas pelo Presidente da Direcção da Convenção Baptista de acalmar os ânimos não conseguiram nada. A assembleia realizou-se, moderada pelo mesmo Presidente da Convenção, e com um consultor jurídico (evangélico) presente para ajudar a resolver qualquer caso de dúvida. Perguntados quais eram os motivos do desejo de despedir o pastor, o cabeça do « movimento» respondeu que eram questões de dinheiro – o pastor tinha chegado a prescindir de um salário! Suponho que, implicitamente, estava a dizer que tinha agido assim para ocultar alguma outra anomalia, mas não foi capaz de apontar nada concreto. Aliás, confrontado com a campanha difamatória que ele e a mulher estavam a orquestrar contra o pastor, «virou o bico ao prego», dizendo que isso era invenção do pastor para os difamar!

Votos postais não foram admitidos – apesar de terem chegado alguns a favor da permanência do pastor. Colocou-se a questão se os votos da família do pastor que eram membros da igreja podiam ser contados – o consultor jurídico aconselhou que sim.

O voto, com maioria de um, foi a favor da permanência do pastor. Mesmo assim os derrotados elaboraram depois um processo judicial para impugnar os votos dos membros da família do pastor – processo este que, após muitas diligências, um outro Presidente da Direcção da Convenção Baptista, os convenceu a abandonar, a favor do testemunho da igreja.

Parece que as novas instalações tinham que ser feitas. E parece que o pastor tinha que ficar mais um tempo em Caldas da Rainha – muito embora, humanamente, pudesse ter desejado ir para qualquer outro lado!

12 janeiro 2010

Dava-nos jeito era um missionário...

O meu antecessor no ministério pastoral em Caldas da Rainha esteve aqui cinco anos. Além de ser um evangelista e doutrinador de reconhecido valor, tinha duas vantagens óbvias. Uma era que, sendo brasileiro, o português era a sua primeira língua. A outra era que, sendo missionário de uma Junta do seu país, tinha o seu sustento garantido, sem a igreja local ter que arcar com essa despesa. Só que, ao aceitar o trabalho de pastorear uma igreja local, deixara de se concentrar no ministério para o qual tinha sido enviado pela sua Junta – que era o trabalho pioneiro de implantação de igrejas.
Quando chegámos aqui, com os nossos quatro filhos, os responsáveis admitiram que o salário oferecido era insuficiente - mas disseram-nos que, logo que a residência pastoral se construísse (e essa era a primeira parte do projecto de construção do novo templo), estaríamos livres de ter que pagar renda de casa, o que iria tornar a situação mais sustentável.
Sendo eu estrangeiro, poder-se-ia pensar que tínhamos alguma garantia de sustento de fora – o que no caso não era verdade.
Não foi preciso estar aqui muito tempo para verificar que o plano ambicioso de construção do novo templo tinha mais a ver com cálculos baseados no crescimento numérico aparente - concretizado e previsto - do que com uma avaliação séria da condição espiritual da igreja. A igreja estava dividida por conflitos, e, salvas honrosas excepções, os seus membros tinham uma fraca noção de compromisso com o Senhor da igreja. Tinha quase cem «membros». Mas só foi preciso um trabalho de visitação pastoral de algumas semanas para percebermos que cerca da metade desses membros tinham pouca compreensão do significado de um compromisso com Cristo. Muitos de facto pareciam mais adeptos da pessoa do meu antecessor do que propriamente discípulos de Cristo.

Uma das primeiras situações que teve que ser revista foi o plano de se construir primeiro uma residência pastoral e, só depois, iniciar a construção do local de culto. Decidiu-se optar pela construção de tudo «no tosco» - o que significava que o terminar a residência pastoral iria demorar muitos anos! Mesmo assim as pessoas começaram a afastar-se pouco a pouco do projecto em si – compreendendo que ultrapassava de longe as possibilidades da igreja.
Tivemos que nos contentar com o pequeno salário inicialmente oferecido, sem perspectivas a curto ou a médio prazo de ficarmos livres do pagamento de uma renda (uns 40% desse valor)!
Como já referi, houve uma saída substancial de membros da igreja, incluindo a maior parte dos jovens, em 1993. Depois a igreja que permaneceu optou por adquirir uma outra propriedade mais pequena e fazer um plano mais realista. Mas, com pouco mais de cinquenta membros, a maioria deles com rendimentos baixos, mesmo esse plano, ao ser bem apreciado, tornou-se um desafio manifestamente ambicioso demais para as nossas possibilidades.
Ainda por cima, o pastor tinha duas desvantagens, que foram sendo cada vez mais sentidas por alguns: uma era que, sendo estrangeiro, não se conseguia livrar totalmente do seu sotaque. A outra, curioso paradoxo, é que não era missionário!
De facto eu pensava que era! Tinha vindo de outro país com um sentido de chamada para fazer o trabalho do Senhor: sentia-me «enviado» por Deus. Mas tornou-se óbvio que ser «missionário», na definição aceite aqui, significava «receber o sustento de fora». Ora, o que dizer de um estrangeiro sustentado pela igreja local – cujo salário, embora insuficiente, não permitia que a igreja acumulasse valores para o seu projecto de construção?

Não era de admirar que, no último domingo do mês, quando o tesoureiro da igreja me entregava o cheque para pagamento do salário, dissesse com frequência, primeiro com alguma candura, mas depois com vontade manifesta de me incomodar:

«Dava-nos jeito era um missionário!».

05 janeiro 2010

Estamos em 2010!

Este ano para a Igreja Evangélica Baptista de Caldas da Rainha é bastante especial. É o ano em que, segundo os planos estudados e concretizados ao longo dos últimos anos, as últimas amortizações dos empréstimos devem ser entregues para pagamento total das nossas novas instalações!
Ao mesmo tempo, quem participa num culto ou actividade social da igreja fica, creio eu, com a sensação de novidade. Famílias novas envolvidas – um trabalho interessante com crianças e adolescentes – novas iniciativas de diferentes tipos. Com 44 membros, a igreja não parece ter crescido muito – em espírito de serviço e testemunho credível perante o mundo à volta tudo mudou! A grande maioria das pessoas que agora estão connosco não conhecem as histórias que vou contar – ou conhecem-na só de ouvido – porque chegaram depois de 1998.
Vou começar em breve uma série de relatos que parecem pesados e tristes. Relatos que revelam por um lado a seriedade – não há dúvida de que as pessoas tinham o objectivo de que a igreja crescesse numericamente e lutaram por ele. Mas, por outro lado revelam mesquinhez, que conduz facilmente à maldade. Quando elas viram alguém que, julgando que tinha um ministério de parte de Deus, incomodava e não pactuava com erros instalados, julgaram esse alguém como sendo um elemento a mais, que devia ser removido para a «paz» e «conforto» de todos.
Mas tenho o prazer de vos contar a maneira bem alegre como a história terminou – antes de a acompanharem no pormenor! E de referir que nunca mais foi preciso o pastor prescindir do salário de um mês, depois dessa altura mais crítica em 1998!
Se o mérito aqui é de alguém, naturalmente é de Jesus, Salvador e Senhor da Sua igreja – que inclui a nossa e todas as que o invocam de coração sincero!

26 dezembro 2009

UM ILUSTRE CALDENSE QUE NÂO QUERIA PROTAGONISMOS.

Desde os primeiros dias em Caldas da Rainha notámos que se sentava no último banco do salão de cultos, um homem já idoso com ar manso mas, de certa maneira, distinto. Perguntámos aos líderes da igreja quem era e respondiam, com uma certa ternura, «é o Dr. Moreira». Nas primeiras conversas que nós tivemos com ele, falou no pai: «o meu pai era pastor e missionário». Pôs-se à disposição para nos dar consultas gratuitas quando precisássemos.
Tão pouco dado a abrir-se, falar publicamente, ou dizer qualquer coisa a respeito de si próprio, o Dr. Moreira só depois de algum tempo confirmou aquilo que eu já estava a imaginar – que era filho do falecido Pastor Eduardo Moreira, distinto autor evangélico e antigo director da Aliança Evangélica. O Dr. Ernesto tinha sido colega de curso de Miguel Torga em Coimbra. Percebi que o Dr. Ernesto tinha vindo para Caldas da Rainha em 1946 – 10 anos antes da fundação da Igreja Baptista - e que, sendo membro da Igreja Lusitana em Lisboa, nunca se tinha integrado nela. Mas frequentava os cultos e ajudava financeiramente .... e dava as suas consultas gratuitas a pastores e familiares no Montepio, de que era director havia longa data.
Quanto a falar publicamente na igreja, era escusado pedir-lhe fosse o que fosse... dizia que não gostava de protagonismos.
Numa altura veio viver connosco uma amiga moçambicana idosa que tinha ajudado a criar os nossos filhos em Coimbra. Passou bastante tempo connosco em casa, como se fosse uma avó. Já tínhamos ganho alguma confiança com o Dr. Moreira e perguntámos se, indo de boleia no nosso carro, podia ir à casa ver a D. Angelina que tinha já muita falta de mobilidade (embora tivesse uns bons anos a menos do que o Dr. Moreira!). Aceitou sem hesitar e, depois de ver os exames, olhou para ela e, com ar muito sério, disse: «a sua coluna está uma vergonha!». Mas ajudou a aliviar de alguma forma as suas dores e, sobretudo, deu-lhe apoio psicológico.
No nosso tempo aqui o Dr. Moreira concluiu o seu projecto de fundar um importante Lar de Idosos na cidade, foi condecorado pelo Presidente da República e uma rua da cidade recebeu o seu nome .... ainda em vida dele!
Com base nas frequentes queixas de pessoas que saíram da igreja, o Dr. Moreira, que tanto nos ajudara e apoiara, convenceu-se que nós não devíamos ser as pessoas certas para o ministério pastoral aqui. Creio que foi com esta preocupação, e com a séria convicção de que eu estava a prejudicar a minha saúde, que um dia disse, no consultório, com frontalidade mas com imenso tacto, que talvez fosse melhor nós pensarmos numa mudança de campo. E lá, no consultório dele, descontrolei-me, dizendo bem alto que não estava em Caldas por vontade própria, mas por convicção de que era Deus que me tinha chamado! Não sei se o Dr. Ernesto se identificava com esse tipo de sentimento: os seus dons eram mais humanitários do que proféticos e talvez esse tipo de convicção lhe soasse um tanto descabida. O facto é que passou a congregar-se com o grupo que saiu da igreja, recebendo muito apoio dalguns deles (muito mais de facto do que nós lhe poderíamos ter dado).
O funeral do Dr. Ernesto foi num dia quente, em Agosto de 2005, quando já completara os 94 anos. Estive presente e falei no cemitério, como também falou um colega que estava a pastorear o grupo dissidente. Uma familiar do Dr. Ernesto, numa certa altura, achou que o meu colega estava a ser longo demais e sugeriu que terminasse a sua intervenção!
O número relativamente pequeno de pessoas presentes não parecia corresponder de modo nenhum à envergadura do trabalho desta figura distinta das Caldas, nem ao seu carácter cristão, humilde e gracioso, que marcaram a vida de tantos, especialmente das classes sociais mais carenciadas, independentemente de pertencerem a uma igreja ou não.

12 dezembro 2009

O ALENTEJANO E O SEU VOLKSWAGEN AMARELO





O alentejano vinha da área de Chança. Era já membro da igreja de Caldas da Rainha há alguns anos quando chegámos aqui: até havia uma acta de uma reunião da igreja que tinha sido secretariada por ele. A sua mulher também era membro da igreja e tinham um filho jovem, um adolescente e uma menina pequena.

O alentejano tinha infelizmente o vício do álcool. Quem tem experiência desse problema sabe como é: ele era dócil e humilde quando não tinha bebido, pedia repetidamente perdão ao Senhor, com lágrimas nos olhos.... mas, depois, caía novamente. E quem o via assim não conseguia compreender as frequentes cenas de violência que surgiam em casa quando ele estava sob a influência do álcool.

De acordo com os nossos princípios, aconselhámos o casal a não encarar o divórcio como a solução para o seu problema. Mas vários períodos de separação teve que haver – para bem da esposa e dos filhos – a título mais imediato (e também dele porque depois se sentia muito culpado!)..

O Volkswagen amarelo do nosso amigo já tinha bastantes anos. Mas ele cuidava-o bem, dentro das limitações da sua situação financeira dificílima.

Houve um período em que, estando separado da sua família, pela razão habitual,
o alentejano não tinha a possibilidade de ir para a sua terra. Resolveu dormir no carro, à frente da sua casa, durante várias semanas. Ao menos assim podia ver a família, dizia ele. Mas os vizinhos comentavam! Talvez alguns tenham pensado que era falta de amor da parte da esposa deixá-lo assim. De facto não sei se realmente pensavam isso – mas ela, a mulher do alentejano, sentia que era assim que eles pensavam. Eles não pensavam no que ela sofria quando o seu marido estava embriagado e entrava em casa! Também não gostávamos da solução que ele encontrou: infelizmente durante bastante tempo não tivemos uma melhor a propor....

...até ao dia em que nos lembrámos de propor que o alentejano fosse passar um tempo num Centro de recuperação da Remar, até porque a sua saúde estava a deteriorar. Ele aceitou esta proposta e foi com mais dois – os outros com problemas de droga – ficar num Centro perto da Serra de Lousã, e posteriormente noutro perto de Azambuja. Neste Centro ele foi estimado e conseguiram que deixasse o hábito de se ir «consolar» na tasca mais próxima. Naturalmente o Senhor o terá ajudado a ganhar força. Devido à idade (tinha cerca de 50 anos na altura), e a problemas cardíacos, não podia fazer os trabalhos duros que era hábito os utentes do Centro fazerem. Mas passou a ser «conselheiro» – os jovens tratavam-no como um tipo de pai.

O seu principal problema era que a sua mulher e filhos estavam longe e ele tinha muitas saudades deles. Ela sabia que, se fosse visotá-lo, ele quereria voltar logo com eles - e voltar com eles poderia facilmente significar voltar ao álcool.

Depois de bastante tempo, num sábado, a sua esposa ganhou finalmente coragem para lhe prometer que o iriam visitar no Centro. Os responsáveis do Centro disseram que esta notícia deu uma alegria tão grande ao nosso amigo alentejano que ele não a podia conter. E, durante a noite, morreu de ataque cardíaco, feliz, pensando na sua família que iria voltar a ver!

Creio sinceramente que nessa altura o alentejano se estava a manter-se livre do vício. E não duvido da fé simples que ele professava antes – e que agora aplicava à sua vida com mais coerência. Mas a sua família – a esposa sobretudo – parecem ter tido sentimentos de culpa, depois da sua morte, com os quais não conseguiram lidar. Apesar de nós lhes termos dito repetidamente que estavam a fazer, na situação, aquilo que podiam.....